quinta-feira, 1 de outubro de 2009

OUTUBRO de 2009 - Classificados de Jornais, mensagens em garrafas e cafés na beira das estradas

As velas

A vela espera o vento
O mar alaga a lágrima
A vela apaga com o tempo
A mar disfarça a água

A vela navega livre e afaga
Acessa tal qual o mar
O tempo espera a água
E a vela se recusa a clarear

A lágrima parte com o vento
Navegações de bocas e luares
A paixão perde-se num tempo
Entre outras bocas e outros mares

Para Leminski

Tudo que é correto demais
Desalinha o mundo, a reta
Um trem fora dos trilhos
Vê coisas que não veria
Se estivesse sempre nos trilhos

Para Leminski II

A verdadeira entrega é feita de coisas escondidas
E fugidias
Assim, a entrega torna-se verdadeiramente transparente
A contradição do dia e da noite foi quem inventou as “18 horas”

Para Leminski III

A chuva bate na porta
Assim, o náufrago aporta

Para Leminski IV


O mar adormece num segundo
No outro acorda o mundo

Para Leminski V

No café da noite
Uma frase rasga o silêncio
Abro um pacote de bolacha e adormeço
Me contaram o final e eu não lembro nem do começo

Para Leminski VI

Não ter o que lembrar é sofrer muito mais quando se tem lembranças
Às vezes a guerra nos faz querer e lutar pela paz

Para Leminski VII

Longe
Esqueci o celular na agência
Quieto
Sem alguém para falar
O mar canta
A noite cai
Como vou acordar amanhã sem despertador?
Preciso me levantar agora

Para Leminski VIII

O que intriga é o interruptor que me atiça
E depois não liga

Escuridão é um elo
Tua foto com o rosto vermelho
Virou um sonho amarelo escondido num livro
Converso com o espelho
E não me entendo

Para Leminski IX

O esquecimento é uma linha que mora longe
Mas rompe perto

Quadrinha de um dia de vento

O vento é cedo
A calmaria vem tarde
O amor dá medo
Quando a paixão arde

Para Cecília

Sou muito tarde
Para um amor tão cedo

Para Leminski e para Betty Blue

O corte que vem d’alma
Foi tatuagem de um grande amor
Cortar é um ato de declamação
A paixão é poda

A flor

O canteiro que hoje flora
Já foi dor
Já foi estio
Já foi rosto que hoje cora
Por um amor que não sucumbiu

Tem uma flor que aflora
Que brinca de tatuar meus sonhos
Continua linda e ainda cora
Quando falo desse amor
Que ainda vive mundo afora
E mesmo com o passar dos anos
Continua agora...

Um versinho para a redenção

Um vento rasga a palavra
Que nasceu para ser inteira
Amor sem dor é corte

Vem com força, ama, sonha e crava
Como sendo paixão primeira
Mas chama de nunca o que já foi norte

Café?

Colocaram café na minha agonia
Colocaram café na minha insônia
Colocaram café na minha alegria
Colocaram café na minha poesia

(Dolores não entende ‘bulufas’ e diz que vai preparar uma boa caipirinha)

Solidão

A solidão dos olhos cheios de lágrimas
A solidão das mãos cheias de calos
A solidão dos faróis cobertos de nuvens
A solidão dos poetas em meio a uma multidão sem versos

Achados

Corre Maria
Corre João
João faz poesia
Maria faz canção
João beija sua nuca
Maria faz nega maluca
E se amam pela noite inteira
Como se tivessem tudo
E eu até acho que eles têm

Nunca

Era determinante o nunca
É o máximo que disse foi talvez
Depois de um “quem sabe”
Acordamos juntos, abraçados

Na outra manhã
Decidi que era a hora do nunca
Olhei fixamente nos olhos dela
É o máximo que consegui foi dizer
“falamos disso amanhã”
Acordamos mais juntos, mais abraçados
E os anos passaram
E a vida passou
E o engano ficou tatuado num lençol

A andorinha e o mágico

A andorinha procura o mágico
Pois ela ouviu dizer
Que mágicos fazem sorrir
E desaparecem para esquecer

A andorinha é tão sozinha
É triste por uma paixão
E pensa que apenas uma varinha
Traga de volta o verão

O mágico ao ver a andorinha
Ficou solene e de joelhos
Disse: “quem voa é feliz
E tirou da cartola seu último coelho

A rua

A rua inteira não canta
Não tem dentes para morder
Nem bocas para sorrir
Nem areias para escrever
Nem telas para colorir

A rua inteira não canta
Não tem palavras para compor
Nem lábios para beijar
Nem lenhas para queimar
Nem frases de amor para dizer

A rua inteira não canta
Não almoça
Não toma café
Não janta

Que alimento essa rua ingere senão o pão dormido que beira agoniado a esperta insônia?

Tortura

Tudo o que agora penso é penso
Desequilibra com a primeira fala contrária
Contrária a felicidade
E tudo que agora penso, cala

Insegurança de um cais que balança o mar
Trêmula mãos de um primeiro encontro
Um sopro que aparenta um forte vento
O destempero dos amantes ao não esconder seus beijos

Tudo o que agora penso é penso
Se move
Engana a frase exata
Desequilibra
Pois as metades pesam diferentes
Difusas
Perdem-se na escuridão
E tudo o que agora penso, apaga



Tempero

Olha o tempero bom que tem... sal da terra e do mar e da poesia de querubins e de andantes de bar... ela é todo mar... Jorge, Ogum, Meu Deus, Oxalá... ela é todo cantar... Olha que tempero bom, vai mel, vai pimenta, vão ervas finas e salsinhas... que tempero bom que ela tem... quando a leio eu misturo bem suas palavras, extraio delas todo o querer... tempero assim meus dias e minhas noites... ah... que tempero bom que ela tem...


I Quadrinhas de outubro

O entardecer da manhã

Anoitece sem entender

Que a razão é vã

Que o acaso dá prazer


II Quadrinhas de outubro

Mora uma moça que amo num porto

Que me faz assim navegar

Longe, muito longe do seu corpo

Naufrago sempre em outro mar


III Quadrinhas de outubro

Procuro uma resposta no e-mail

Nenhuma mensagem no celular

Que saudade do correio

Ou da mensagem em garrafa via mar


Medos

Entristeço

Acendo a luz

A claridade me faz não enxergar

Tua boca perde-se na noite escura,

Que eu teimo, por medo, não beijar


Bia

Bia toca violão

Joga comigo general

Todo o vôo da Bia

Era assim tão natural

Tinha sol no seu olhar

Sua vida tinha sal


Vestido

Leio “Vestido de Noiva”

Nelson virou cotidiano

Nada mais deixa rubra a moça

Nem o passar dos anos

Romance

Foi numa noite na Barra
Ao navegar de canoa
O cantor viu um lume
Que vinha lá da Lagoa
Tinha faíscas de céu
Vestido preto e vassoura

Teu olhar é um feitiço
Linda flor de laranjeira
Um chá bebido num gole
Poção menina faceira
E quando viu o cantor
Nasceu a paixão primeira

Não importa
Se foi bruxa ou princesa
Se foi rainha ou sereia
Se tinha casa na lua
Se tinha castelo de areia
O que vale foi a paixão
Que nasceu nas Rendeiras


Canção do Engenho

Roda a vida, destino

Move o tempo, sereno

Sonha com a moça o menino

E canta a canção do Engenho

Anos 80 nas folhas

Nas folhas dos calendários

Verdes como teus olhos

Olhares incendiários

Gira a roda, moinho

Move o teu coração

As águas onde navego

Nasceram desta paixão

Tenho um Engenho na vida

Feito receita de pão

E gira a rosa dos ventos

Até virar floração

Lua Mansa que arde

Na lembrança viva que tenho

O meu boi volta pra rua

E canta a canção do Engenho

Canta Engenho canta

Deixa o mundo rodar

Se a vida tá cansada

Deixa a vida vadiar

Letra dedicada à: Chico, Muniz e Alisson


Vou encontrar meu final feliz – Minhas mulheres

Amelie

Quirina

Betty Blue

Dolores

Uma flor

Uma narradora

Um amor primeiro

Sete “marias”

Sete nomes

Sete sinais

Minhas mulheres

Minhas paixões

Minhas meninas

Paixões

Eu estou andando sem estrada

Numa cilada que eu mesmo armei

Na boca um beijo guardado

Quase tatuado, resguardado, feito vinho bom

Nas janelas passam cores que eu nunca vi

E eu jogando conversa fora sem cor

As possibilidades são como chuvas

As vezes inundações, as vezes estios, e vão e passam

Quero encontrar minha estrada

E a boca da mulher amada que ainda amarei

Sei que não está tão longe, sinto que arde e vou encontrar meu final feliz

Que vi num filme na sessão da tarde

Chuva

Uma chuva intensa bate à minha porta

Pedindo para me encharcar

Diz que vivo assim muito seco

Sempre com medo de me molhar

Eu quero o amor da minha vida

Feito a música do Cazuza

Nem que seja inventado

Como a poesia que eu fiz e nunca foi lida

A chuva cai e me leva

Não quero mais àquele amor

Pro café

Pro almoço

Pra janta

Quero um amor sincero, sem tempo, sem data,

sem explicações para tudo, para todos, para sempre...

Seco agora só o vinho... que venha a chuva...

Falas

Existe uma sombra na noite que não termina

Passam manhãs, passam dias, meses, anos e ela continua ali

Uma ferida aberta em mar aberto,

Uma vida cansada em corpos cansados,

Todo um grito que não se ouvia,

Agora explode em silêncio e agonia

Ser escritor é uma ferida aberta sempre,

Levamos para a vida tristezas em linhas da mão e precisamos lê-las,

A felicidade precisa de leitura

Mas dói muito, cansa, absorve

Muitas vezes nos entregamos a um silêncio profundo e arrepiante,

Tal o menino de poucos anos vendo um filme de terror e não querendo mostrar medo,

Ou recebendo os carinhos da prima e não querendo mostrar medo

Guardo tudo em si,

Em notas que somente “eu” entendo

Bebo

Todo àquele vinho que sinto,

àquele chileno seco, tinto

trouxe-me palavras que queriam gritar

mudas por tanto tempo

puderam agora falar e em vez de sopros vieram ventos

liberdade começa assim

liberdade para sentir, para viver, para amar

agora posso


Primavera




A flor da pele na primavera arrepia mais, pétala por pétala. Incendeia , faz contato com o luar ... vem e não espera, a presença da pele aflora a flor e provoca o tempo... colher é um beijo entre canteiros e bocas, procuro enlouquecidamente a tua boca.


Recaída

um escorregão, assim mando um beijo de muita saudade

quem sou eu para policiar meu coração?